Para fazer arquitectura é necessário um cliente, um promotor. Quando percebi, num determinado momento da minha carreira que para poder continuar o meu percurso teria que ocupar também esse lugar, não hesitei. Foi precisa muita coragem. Conciliei objectivos, interesses, metas, persegui um ideal e concretizei um sonho. Tive também necessidade de ser, neste trabalho, fiscal, coordenador e director de obra, numa organização em administração directa.
Iniciei este trabalho em 2004 e terminei no início de 2005. A obra começou em Fevereiro de 2006 sendo concluída em Julho de 2010.
O projecto da própria casa-atelier, é o primeiro onde estão presentes figuras tocantes na sua atmosfera, exaltando obras, personalidades que derivam da história, versus sensibilidade, recriando individualmente realidades, sem uma intenção previamente definida. Aparecem no meio de uma entrega a um crer para além do que se pretende, sublimação subjacente à comunicação autêntica do processo criativo.
Quando o Moderno está Velho surge um passado distante na sua expressão mais eloquente. A afirmação de um novo Romantismo, de um Renascimento Clássico, vindo directamente das origens, com a carga do anterior não menos importante, fusão entre um rigor geométrico clássico e uma liberdade criativa romântica.
A Casa própria como laboratório de um imaginário, que representa as pulsões, ideias, tensões e forças por detrás da matéria. As histórias e suas emoções que condensa, os simbolismos que representa. As figuras e relações humanas.
Neste projecto, nascido do desenho livre da figura de um arlequim – a rir-se de problemas, de conflitos, de desencontros, de dificuldades de comunicação, entre outros dramas envolvidos nesta actividade - e que se transforma numa abstracção geométrica, onde não há lugar a caixilharias ou vidros, ensaio a afirmação de um novo classicismo. Espaços de transição, os pórticos, a luz, candeeiros, puxadores, portas, corrimãos, pinturas e o mobiliário desenhados por mim, mas também outros do século XIX (peças intemporais) que vieram da família e que no contexto tão bem se enquadram, entre outros elementos, complementam a criação de ambientes que exaltam Mozart, Leonardo da Vinci, Miguel Ângelo, e tantas outras figuras e obras de Arte tocantes, não se limitando à atmosfera de um imaginário exclusivamente arquitectónico.
A concretização deste ideal foi possível devido a uma característica de personalidade de teimosia obstinada e insatisfação não menos expressiva. Começou há 12 anos, com a aquisição de um terreno sem acesso à rua e por isso financeiramente mais favorável. Nos 6 anos seguintes procurei encontrar uma ligação que tornasse tudo isto exequível. Tive a sorte de o promotor de um terreno devoluto ser primo direito da minha mãe, acabando por mo vender. Fui forçado a comprar outro lote confinante, para viabilizar o negócio, que revendi com projecto pessoal aprovado. Desta forma, capitalizei, investindo todo o dinheiro neste negócio.
Durante a necessária operação de emparcelamento dos terrenos, surge o projecto, resultante de um discurso de intenções paradoxais.
Casa/Atelier; Espaço Interior/Espaço Exterior; Espaço Social/Espaço Cultural; Privado/Público; Lazer/Trabalho.
As suas volumetrias organizam-se por secções verticais e horizontais. Um programa constituído por um atelier junto à rua, garagens e zonas de serviços funcionando como charneira, e finalmente a casa relacionada com o jardim. Um piso subterrâneo correspondente às fundações, outro térreo em granito, correspondente aos espaços públicos e sociais e ainda o piso superior. Se por um lado o piso térreo se exprime de dentro para fora, da intimidade para o exterior numa manifestação explosiva, criando as necessárias aberturas, os pórticos de transição e os respectivos lanternins de luz natural; por outro lado, o piso superior implode. A agressão do meio exterior cria simbolicamente tensões, pressões que se reconhecem de fora para dentro, reduzindo a sua volumetria, dando origem a uma imagem figurativa. Através de uma abstracção geométrica rigorosa para possibilitar o sistema construtivo, constituída por losangos associados em diferentes ângulos, que lhe conferem maior tridimensionalidade, encontrei a proporção que pretendia, a horizontalidade desejada, a orientação previamente definida, a direcção objectivada e determinada. O simbolismo da figura que sublima a opressão de um sistema.